DESABAFO DO ORÁCULO DO PÃO DE 01 A 03 DE FEVEREIRO DE 2013
“NÃO À EXPLORAÇÃO DA TRAGÉDIA EM SANTA MARIA!!!”
Ontem recebi uma Edição Especial de uma revista semanal e, em seguida, telefonei para meu pai perguntando se ele não queria ler o exemplar – afinal ele é uma pessoa que gosta de estar bem informado, ávido por analisar diferentes pontos de vista e que tem uma visão crítica e reservada sobre o que ocorre ao redor. Ele é um homem de poucas palavras; é preciso “futricar” para saber o que pensa.
Qual não foi minha surpresa ao ouvir: “Não aguento mais escutar sobre Santa Maria. Quando vão parar de explorar essa tragédia?”.
Parei para pensar, afinal não era a opinião de alguém que fosse insensível à dor do outro, muito pelo contrário, e deparei-me com o tênue limite entre sensibilizar e conscientizar a população, gerar ação e explorar de modo insano uma tragédia, desrespeitar os envolvidos. Por que publicar uma edição especial com fatos que já foram amplamente divulgados sob a pecha de fatos inéditos?
Em resumo, nesse caso específico chegou-se à conclusão de que a negligência da prefeitura, dos donos da casa, da banda que se apresentou...levou a uma catástrofe. E o que cabe aos veículos de comunicação e a nós fazer a partir de então?
Há duas opções: usar o terrível evento como aprendizagem para evitar outros semelhantes ou usá-lo para atrair a audiência de alguns que se alimentam da morbidez dizendo “Graças a ‘Deus’ não foi comigo”. (Coitado de Deus, o que Ele tem a ver com isso?)
Será que a mídia está preocupada como a excessiva divulgação do fato está repercutindo aos diretamente ligados ao incêndio da Boate Kiss? Caso seu filho estivesse entre as vítimas, como se sentiria ao ligar a televisão, o rádio, conectar-se à Internet e sempre ver em destaque o horror de Santa Maria? Isso o ajudaria a seguir em frente?
A imagem de uma mulher, viúva há dois anos, que perdeu seus dois filhos no incêndio, consolando em vez de ser consolada, chamou-me a atenção; em especial após vê-la ser abraçada por uma conhecida, dar as costas à câmera e partir chorando.
Meu desabafo não é uma execração à imprensa, muito pelo contrário. Admiro os meios de comunicação e seu compromisso em conscientizar a sociedade, mas é importante estabelecer limites entre o que serve de aprendizado, leva à ação e o que simplesmente gera o luto inativo.
O caso “Nardoni” causou grande comoção nacional. A atenção ao caso foi tamanha que só faltou ser divulgado o que o pai e a madrasta de Isabela tomavam no café da manhã e algum especialista em nutrição dar sua opinião sobre como os hábitos alimentares do casal influíram no crime.
Alguém sabe qual foi o destino de Suzane Richthofen, acusada e presa por ter planejado a morte dos próprios pais com o auxílio do então namorado Daniel Cravinhos e do irmão deste, Christian Cravinhos?
O que sucedeu a Guilherme Pádua e sua esposa Paula Nogueira Tomaz após terem brutalmente assassinado Daniela Perez com 18 punhaladas? Pelo que sei ambos estão em liberdade.
Lembra-se do estuprador do parque que violentou e executou inúmeras garotas cujo desejo era se tornarem modelo? Onde está ele? Não tenho a mínima ideia.
Infelizmente, a memória de muitos, em virtude das exigências do dia a dia é curta, assim como a minha, e o desenlace de tais ocorrências, de modo geral, só continuam a ser acompanhados e estudados por terapeutas comportamentais.
Ressinto-me ao perceber que a mídia não reserva o mesmo espaço à histórias de superação como a do atleta parolímpico Oscar Pistorius, de 24 anos, que disputou os 400m no Mundial de Daeguque em 2012 com atletas olímpicos.
Ver entrevista em: http://blog.institutosuperar.com.br/2011/08/astro-paraolimpico-faz-historia-ao-disputar-mundial-entre-atletas-sem-deficiencia-fisica/.
Infelizmente, tenho a impressão de que hoje estamos brincando de amarelinha, indo de uma catástrofe a outra agradecendo por, pelo menos dessa vez, não termos sido atingidos.
Mas, como disse Shakespeare: “São poucas as diferenças entre as histórias da humanidade”. Grande parte delas tem como origem o descaso. Qual seria sua reação ao saber que talvez você, ou os que lhe são próximos, fosse o próximo alvo?
Com indignação,
Cláudia Coelho
PS: Caso queira ouvir uma abordagem positiva sobre as implicações e reações à tragédia de Santa Maria, acesse a entrevista com a Monja Coen e o professor da FMUSP e psiquiatra Mário Rodrigues Lousã que foi ao ar no programa “Caminhos Alternativos” da rádio CBN em 02 de fevereiro de 2013:
http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=jgEcld01zPI
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